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Realidade misturada na produção virtual da série 1899

Colorista Steffen Paul ficou encarregado do tratamento UHD HDR no DaVinci Resolve em 1899, a série multigênero e multilíngue de sucesso da Netflix

Por Ricardo Batalha

1899, a série multigênero e multilíngue de sucesso da Netflix maravilhou e surpreendeu o público em igual medida. 1899 inovou a produção cinematográfica e também testou os limites da narrativa televisiva.

Ostensivamente um drama de época ambientado em um navio de passageiros cruzando o Atlântico no século XIX, 1899 rapidamente estilhaça essa calma fachada e atira-se de cabeça em um mundo histórico de existências paralelas, experiências aterrorizantes e inescrutabilidade generalizada. Mas, isso é para a felicidade do público. O programa, dos criadores de Dark, Jantje Friese e Baran bo Odar, oferece altos valores de produção, cenários e figurinos de época opulentos, cinematografia suntuosa, atuação exemplar e efeitos visuais impactantes. Isso foi ajudado em grande parte porque 1899 contou com boa parte do talento criativo por trás de Dark.

Nikolaus Summerer fotografou com a sua cinematografia de alto padrão habitual em 1899, enquanto a pós-produção do tratamento das cores e som foi feita pela Basis Berlin, onde o colorista Steffen Paul ficou encarregado do tratamento UHD HDR no DaVinci Resolve. Os dois desempenharam funções semelhantes em Dark e em projetos anteriores com Friese e Odar.

Desenvolvimento virtual
Para atender às necessidades específicas da narrativa de 1899, um enorme “Volume” com um painel LED circular de 270 graus foi erguido para filmagens junto de uma plataforma giratória com rotação de 360 graus. Esse ambiente de produção virtual possibilita substituir os planos de fundo em tempo real projetando conteúdos em CGI e pré-captados nos painéis LED para que os movimentos sejam rastreados juntos do ângulo de câmera e combinados à ação real no palco.

Contudo, essa inovadora metodologia “in-camera” de modo algum representa o fim da pós-produção. Os efeitos visuais ainda são muito necessários, e o tratamento de cores e a finalização são mais essenciais do que nunca. “Na produção virtual, muitas partes da imagem são criadas antes das filmagens. Você começa com os efeitos visuais e a filmagem acontece por último”, disse Steffen Paul.

A participação de Paul começou durante a pré-produção e os testes, produzindo um look padrão para o tratamento de cores, uma LUT de exibição, que era aplicada a todos os monitores e aos copiões usados na produção de 1899. “Esperávamos que uma LUT para a produção inteira seria suficiente”, ele explica. “Isso é especialmente relevante ao preparar a pipeline do tratamento de cores entre todos os diferentes fornecedores de VFX e a sala de montagem. Há muitas informações que você precisa monitorar – não queríamos que a LUT de exibição fosse outra variável nessa configuração”.

A pipeline de colorização tinha latitude para evoluir. “A transformação do look principal está fixada desde o primeiro dia, mas a correspondência das cenas, a compensação de exposição e encontrar o tom certo para uma cena são igualmente importantes”, disse Paul. “A equipe de copiões da Panoptimo em Munique fez um trabalho fantástico e tinha que assumir a responsabilidade inicial no set.”

Depois que as imagens tinham sido definidas, o trabalho na Basis Berlin começou para valer, iniciando-se com uma conformação em um sistema DaVinci Resolve completamente expandido. “As capacidades de montagem e online foram tão aprimoradas no Resolve que não fazia sentido fazer a conformação em outro lugar”, disse Paul. “Utilizamos as transformações de cores conformadas na CDL em conjunto com o gerenciamento de cores ACES e a LUT de exibição para criar um ponto de partida para o tratamento do intermediário digital.”

Paul acha que a produção virtual requer mais tempo na intermediação digital do que em cenas filmadas tradicionalmente. Combinar um set físico com efeitos atmosféricos e um fundo virtual era um processo particularmente complicado.

“Com o Volume, você fica trabalhando constantemente para melhorar a maneira de misturar o primeiro e o segundo plano”, observou. “Uma das coisas que separam os dois é a nitidez aparente. O painel LED muitas vezes tem uma aparência suave, possivelmente porque a resolução real dos painéis é limitada. O que ajudou nisso foram as ferramentas de nitidez da página Cor no DaVinci, especialmente o Salto de Textura, que permite ajustar a nitidez de bandas de frequência específicas sem afetar outras.”

O controle sobre o contraste e as cores também era fundamental. “O ‘Volume’ tende a refletir muita luz se você iluminá-lo externamente. Isso resulta em pretos imprecisos que ficam bem ruins, especialmente em uma cena com os pretos corretos no primeiro plano”, explicou Paul. “O espectro da luz emitida pelos LEDs RGB não é contínuo e não tem muita força na parte laranja do espectro onde os tons de pele residem”.

Paul é um usuário voraz da linguagem de transformação de espaços de cores DaVinci (DCTL), que ele utiliza para criar transformações personalizadas. “É uma ótima maneira de testar suas ideias sobre como as cores podem ser manipuladas”, ele explica. “Algumas dessas transformações mostraram-se úteis em situações onde precisávamos ajustar o contraste do ‘Volume’, mas onde não podíamos isolar o segundo plano de um modo tradicional. Eu podia alterar o contraste em uma região de cor específica – geralmente, apenas o azul – para conseguir o resultado desejado”.

“Em algumas cenas interiores que se passavam dentro de cabines, em um certo momento achamos que seria legal ver o mar”, continuou. “Naturalmente, essas cenas foram filmadas no estúdio sem um segundo plano. Fizemos uso extensivo da ferramenta Combinação de Movimento para posicionar um horizonte ligeiramente visível à distância sempre que necessário. Acho que tarefas como essa ficarão ainda mais simples com o rastreador de superfícies na versão 18 do DaVinci Resolve”.

O plug-in Adição de Cintilação no Resolve Studio também ajudou. “Eu estaria perdido sem ele”, disse Paul. “Há tantas situações com fogo, pessoas com lamparinas, cintilação vinda dos monitores que as pessoas olhavam ou sinalizadores de emergência que tinham que ser refletidos nos rostos dos personagens”.

Foi divertido trabalhar em certos planos. “Vale a pena destacar as cenas que acontecem nos alojamentos inferiores do cargueiro. O designer de produção Udo Kramer fez um trabalho incrível nessa parte”, Paul relembra. “Mas, existem cenas nas quais você precisa trabalhar mais, muitas vezes com a ajuda do departamento VFX”.

Masterizando os mistérios
As entregas finais de 1899 eram feitas com um IMF para cada episódio, segundo as normas da Netflix, entregues em UHD com metadados Dolby Vision e um mix Dolby Atmos. “A partir da linha de tempo do tratamento de cores, renderizávamos o máster digital original em ACES para controle de qualidade e masterização”, disse Paul. “A equipe de masterização usa o ColorFront Transkoder para codificar o IMF final e todas as outras entregas. Acho que é ótimo poder separar o processo de tratamento de cores e entrega, assim as pré-entregas podem ser enviadas a qualquer momento, sem interferir com a linha de tempo do tratamento de cores”.

Paul acha que as várias equipes alcançaram algo único juntas. “Os fãs de Dark certamente reconhecerão a grafia visual e há um pouco de semelhança no modo como lidamos com as cores”, ele disse. “Mas, acho que tentamos dar um passo a mais dessa vez. É muito fácil cair em gêneros com o visual; não queríamos isso. 1899 começa como um drama histórico e se torna um thriller sombrio, apenas para se tornar uma obra sci-fi. O look tinha que atender a todos esses gêneros, então queríamos fazer com que parecesse histórico e moderno ao mesmo tempo. Gostamos de mistério e suspense, então tudo é muito sombrio, como é de se esperar”.

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