Conversamos com o presente e o futuro da CIS Group, integradora que completa 30 anos em 2018 e carrega consigo grande parte da história da radiodifusão no Brasil.
Em uma indústria tão dinâmica quanto a de tecnologia para Broadcast, é comum vermos empresas surgirem e sumirem de acordo com a mudança da maré de tendências e necessidades das emissoras de TV. Das grandes corporações às startups mais ousadas, neste mercado, todos estão sujeitos a se tornar obsoletos à qualquer momento, ou perceber que seu modelo de negócio vai precisar mudar vertiginosamente.
É exatamente por isso que quando vemos uma empresa completando três décadas de existência, como é o caso da CIS Group, é preciso tirar o chapéu. Ainda mais em se tratando de uma empresa brasileira de integração de tecnologia, vertical que muitas vezes está sujeita a mudanças de gestão de fabricantes representadas, turbulências econômicas no país e demais transformações tecnológicas de padrões que tanto ocorreram no Brasil. A verdade, é que alcançar seu trigésimo aniversário, a CIS Group não só mostra sua capacidade de renovar, reinventar e atender seus clientes, como torna-se uma espécie de guardiã de boas receitas de sucesso e, por que não, de um bocado da história da Radiodifusão no Brasil.
Para resgatar este passado, sorver um pouco da visão de negócios e entender o futuro da empresa, conversamos com Guilherme Silva, CEO da CIS Group e seu filho Matt Silva, que vem paulatinamente assumindo um papel cada vez mais central na gestão e expansão da companhia. Durante a conversa, falamos sobre história, o embate com outras empresas do mercado brasileiro e a passagem de bastão da liderança da companhia.
Panorama Audiovisual: Como começou a história da CIS Group?
Guilherme Silva: De certa forma começou com meu primeiro trabalho no mercado broadcast no dia 23 de novembro de 1976 na TV Globo Brasília. Menos de 30 dias depois eu fui pra TV Globo Rio como estagiário na área de manutenção de VT e me apaixonei por vídeo. Foi o aprendizado dentro da Globo que me propiciou posteriormente ir trabalhar na Ampex onde fiquei por vários anos. No inicio de 1987 eu tinha voltado dos Estados Unidos e era responsável pela Ampex no Brasil. Foi minha despedida da área de engenharia e entrada na área de negócios! Logo fui avisado que a empresa iria me transferir em 1988 para Hong Kong com o objetivo de cuidar dos negócios numa região muito extensa e que incluía a China. Veja, ir morar na China em 1988 não era uma aventura que me agradasse muito. Então negociamos, eu me desliguei da empresa em bons termos e montei meu próprio negócio. Meu primeiro cliente foi a própria Ampex, na época na modalidade de consultoria, para o Brasil e parte da América Latina. Este foi o início do que é hoje a CIS Group, que na época se chamava Crosspoint. Tudo começou comigo e com a Márcia Andrade, que estava há mais tempo do que eu na AMPEX, e que aceitou o desafio.
PAV: Durante estes 30 anos, muito mudou na estrutura do Brasil, com idas e vindas de diferentes planos econômicos e padrões de tecnologia. Como você vê a evolução do trabalho de um integrador de tecnologia como a CIS Group ao longo destas décadas?
Guilherme Silva: Sem dúvida houve pontos bastantes cruciais, como o famoso Plano Collor, a forma como eram feitas as transações nesta época e também a questão tecnológica. O Brasil ainda vivia de padrão PAL-M. Embora estas transições tivessem tido impacto na nossa evolução como CIS Group, elas não foram tão grandes quanto poderiam ter sido. Quando eu e a Márcia abrimos a empresa, em 1988, alguns dos meus amigos que ainda continuam no mercado, disseram que eu era louco, que era impossível o que eu queria fazer. Isso porque eu dizia que havia duas coisas que eu jamais iria vender: câmeras e VTs. Então o pessoal pensava que eu era um sonhador, que eu estava fadado ao insucesso. E, na realidade, as coisas não foram bem assim.
O simples fato de termos que começar a buscar soluções em função de não vendermos nem câmeras, nem VTs, embora eu viesse da Ampex e da Globo, fez a nossa busca por alternativas de tecnologias de televisão e produção um desafio tão grande que estávamos preparados para todas estas transições antes de elas acontecerem.
Claro, a diferença do trabalho de um integrador da época para um integrador hoje é imensa. Primeiro porque hoje o conhecimento necessário para fazer uma integração envolve um espectro muito maior de áreas tecnológicas do que envolvia antes. Segundo porque tem menor peso do hardware mas, em compensação variáveis muito grandes na área de software. Mas a maior diferença é o conhecimento da utilização. Para um integrador ter sucesso, ou ele conhece profundamente o que o cliente dele faz e como faz e vai buscar soluções que de fato atendam a esse cliente, ou não vai conseguir o reconhecimento de um integrador capaz de atender às necessidades, bem diferentes, dos conglomerados de mídia digital dos dias de hoje e simultaneamente atender aos crescentes desafios da criatividade e busca por otimização dos processos de produção.
Um dos pontos mais negativos do mercado brasileiro, que é o fato de haver duas definições de integrador. Primeiro o vendedor de caixa que se diz integrador. O outro tipo de integrador é o que ajuda na concepção do projeto, na escolha da tecnologia mais adequada que atendam de forma eficaz ao “negócio” do cliente
PAV: Há no Brasil uma certa confusão entre o que é um importador e o que é um integrador. Como você vê hoje a CIS Group e porque você acha que existe esta confusão no país?
Matt Silva: Para classificar a CIS Group eu diria que estamos muito mais para o lado de integrador. Nosso valor reside nos serviços que oferecemos, no conhecimento que temos, na experiência em mercados internacionais ao longo de 30 anos, sempre agregando valor ao produto básico e oferecendo um dos melhores pré e pós venda em todos os mercados que operamos. Uma revenda ou um representante tradicional tem muito a mentalidade de vender caixas, e nossa tese na CIS Group sempre foi vender a solução completa.
Em termos do mercado brasileiro existe esta área meio cinza sim porque há um certo desconhecimento das operações de cada empresa, o que considero bem natural, já que cada empresa tem seu método de operar, o qual é seu segredo de mercado. Acredito que existe esta confusão porque existem vários players neste mercado no Brasil e, apesar da grande maioria deles terem a mentalidade de representante comercial, existem alguns com perfil mais de importadores, e finalmente algumas empresas que se consolidaram como os grandes SIs (Systems Integrators) do mercado brasileiro.
PAV: Vocês acham que no Brasil há muito ‘vendedor de caixa’ que se diz integrador como uma forma de enobrecer seu trabalho?
Matt Silva: Acho que sim. Isso é muito uma questão de branding para ser sincero – ajuda a valorizar a imagem de uma empresa quando você vende este conceito de ter um conhecimento da solução inteira. Mas na realidade, quando você para e analisa, tem muito vendedor de caixa mesmo. Infelizmente, o cliente às vezes acaba pagando um preço alto por se deixar levar por essa imagem falsa.
Guilherme Silva: Este ponto que você levantou talvez seja um dos pontos mais negativos do mercado brasileiro, que é o fato de haver duas definições de integrador. Primeiro o vendedor de caixa que se diz integrador, que na realidade o processo de integração dele é pegar a caixa num estoque e mandar para o Brasil. O outro tipo de integrador é o que vai muito mais além, ajudando na concepção do projeto, na escolha da tecnologia mais adequada, fazendo a importação sim, mas sempre criando soluções que, mais do que mera junção de tecnologias, atendam de forma eficaz ao “negócio” do cliente. Um exemplo, voltando ao tempo em que surgiram os NLEs: muitas empresas achavam (ou eram motivadas a achar) que instalar um servidor com hard drives e algumas workstations conectadas em rede era o suficiente para criar um sistema de edição colaborativo… e sabemos que não é isso. A integração de um sistema passa por ter o conhecimento profundo da tecnologia, da demanda, das variáveis em jogo e entender que essa tecnologia está permanentemente sendo atualizada.
Matt Silva: Vira uma questão de como você monetiza seu negócio. Há várias soluções no mercado que merecem questionamentos semelhantes. Há que definir se a preferência na hora é trabalhar com uma empresa que vai endereçar um problema hoje via uma caixa, ou uma empresa que tem uma base de conhecimento que pode oferecer uma solução inteira, e que no final das contas tem um paralelo com o seu negócio pois, ele é monetizado quase da mesma forma que a venda de uma solução: a médio/longo prazo.
PAV: Vivemos um grande boom econômico no país entre 2007 e 2013 onde vimos muitas empresas novas vindo para o mercado brasileiro. Com a crise que começou em 2016, muitas destas empresas desapareceram do mercado. Vocês acreditam que isso é um movimento natural, ou houve um oportunismo comercial?
Guilherme Silva: De fato o ano de 2011 foi excelente por conta do começo das negociações para a Copa no Brasil. Acontece que em 2010 eu estava na África do Sul e pude voltar lá no pós-copa para ver como estava o mercado, e sabia que este tipo de “depressão pós-euforia” poderia acontecer no Brasil também. Em nosso mercado surgiu a questão das empresas aventureiras, que são essas que desapareceram depois da crise. Obviamente, as emissoras e produtoras são inteligentes o suficiente para não investirem só porque um quase desconhecido chega aqui e diz que tem a solução para todos seus problemas por metade do preço tanto o cliente, como nós integradores sabemos que isso não representa a realidade dos fatos. No Brasil temos clientes que viveram muito a experiência de lidar com o PAL-M. Era um padrão que só existia no Brasil, só tinha meia dúzia de fabricantes, o que era propício à manipulação de preços dos equipamentos porque não havia demanda suficiente. Os clientes que viveram isso sabem o quanto a continuidade e a permanência das empresas em momento de crise é relevante, mas também são negociadores o suficiente para virar para as empresas tradicionais e usarem o momento de euforia para barganhar preços, aproveitando a presença desses “milagreiros e aventureiros” em território nacional.
É a famosa diversificação. Realmente é um processo ao contrário, operar com foco no Brasil e daí expandir para os EUA
A CIS Group sempre lidou com essas crises entrando em compasso de espera. Não existe missão suicida de baixar preços sem análise dos impactos a longo prazo porque sabíamos que logo após a crise, vários concorrentes do tipo oportunista sairiam do mercado – os famosos integradores de caixas e vendedores de milagres tecnológicos – e a gente poderia voltar a trabalhar da forma que sempre trabalhou, com uma infraestrutura que permanece intacta, crise após crise do Brasil, há 30 anos.
Considero um processo normal os grandes fabricantes apostarem em mercados que estão compradores. O que não é normal, e o que ainda continua não sendo normal, e acho que todo mundo aprendeu, é este processo irresponsável de quem veio, vendeu qualquer coisa, e sumiu.
Matt Silva: Eu acho que o Brasil é um mercado super interessante porque é um dos lugares onde nossa indústria mais valoriza a lealdade. Se você está aqui há 30 anos operando, focado no cliente, dando a solução, o mercado valoriza seu “commitment” e te premia no final das contas. Durante estes últimos anos, eu acredito que o Brasil virou uma espécie de “selo de aprovação”, para empresas poderem dizer que venderam na maior economia da América Latina e que atenderam alguns dos clientes mais complexos do mundo. E alguns fabricantes entraram no mercado, fizeram sucesso, conquistaram este selo, e depois, quando acabou o dinheiro, foram embora. E isso, no futuro, como o Brasil é um mercado que valoriza lealdade, não será esquecido pelas empresas que há decadas produzem conteúdo reconhecido mundialmente pela criatividade e qualidade.
PAV: Vimos a CIS Group começar uma expansão internacional há algum tempo em uma espécie de movimento às avessas do padrão, saindo do Brasil para os Estados Unidos, quando é mais normal vermos empresas americanas tentar a sorte aqui. Como anda este processo de expansão?
Guilherme Silva: Na realidade o que nos levou para fora do Brasil inicialmente foi esta montanha russa que é a economia brasileira, enquanto a economia americana é quase independente do governo: não interessa se é Obama ou Trump, a máquina gira. A economia brasileira depende muito de legislação e de incentivos econômicos. Fazer planejamento de longo prazo no Brasil é quase que bruxaria, algo como usar uma bola de cristal. Quando me chega gente dizendo que o dólar vai estar em algum patamar no final do ano, eu fico querendo saber no que o cara se baseou pra dizer isso, qual o fundo científico dessa afirmação, qual a teoria.
Então o que nós fomos buscar foi a “dessincronizarão das senoides” dos altos e baixos das economias. A ideia foi criar um modelo de negócios em que estas ondas senoidais fiquem defasadas entre 90 e 180 graus. Ou seja, quando o Brasil cai, começa a subir lá fora, mantendo a solidez da empresa para poder continuar dando suporte e compartilhando os problemas e soluções de nossos clientes. Se não tivermos fabricantes sólidos por trás, alguns carros-chefe, solidez financeira da empresa, não adianta. Então o motivo de ir para fora foi buscar isso e acredito que conseguimos.
Matt Silva: É a famosa diversificação. Realmente é um processo ao contrário, operar com foco no Brasil e daí expandir para os EUA. Eu venho do mundo financeiro onde estudamos o conceito de Alpha, que é o retorno em excesso do esperado. Para se gerar Alpha, primeiro você precisa estar certo, o que já é difícil. Em segundo, você precisa tomar uma posição que seja oposta ao que o mercado acha que está correto. Então você precisa estar certo e o mercado precisa estar errado. A gente pensa muito assim na CIS Group em termos estratégicos, quando todo mundo espera a gente operar da forma X, a gente pensa em operar da forma Y. Sempre tem que ter a oportunidade de fazer algo diferente.
Claro que seguimos um padrão de não vender em nenhum lugar onde não possamos apoiar a infraestrutura com pós-venda. Então, naturalmente, precisa ser uma expansão gradual. Para nós até que foi bastante natural porque nossa sede é na Flórida desde 1997. Então começamos por lá, atuando com alguns clientes com quem já tínhamos uma relação boa, e expandimos para cobrir a costa Leste. Focamos bastante na Flórida, Georgia e Nova Iorque. Em Nova Iorque temos uma equipe de pré-vendas, na Flórida temos equipe de engenharia, pré-vendas, vendas e pós-vendas. Mesmo sendo uma expansão gradual, tem sido realizada até mais rápido do que esperávamos. Neste modelo de expansão, hoje conseguimos estar em qualquer região que atendemos para prestar um serviço em menos de 24h.
É um mercado difícil de entrar, particularmente em Nova Iorque onde há muitos players. E é um mercado que existe uma estratégia totalmente diferente do Brasil, pois é extremamente fragmentado. Sendo assim, você tem vários “touch points” para cada projeto. Na produção de uma série televisiva no Brasil, há uma grande empresa que faz tudo. Nos Estados Unidos você vai acabar lidando com até seis empresas diferentes. Além da estratégia diferente, isso também representa uma oportunidade de consolidação enorme nesse mercado nos EUA.
Guilherme Silva: O interessante é que a CIS Group tem tido sucesso nos EUA em um segmento que é tradicionalmente proibido para os integradores, que são as grandes emissoras que são clientes normalmente atendidos diretamente pelo fabricante. Quando chegamos aos EUA em 1997 integrando para a América Latina, eu tinha receio de ir em algumas reuniões com os fabricantes e clientes americanos. Eventualmente comecei a ir e passei a sentir que cada vez que íamos juntos, as coisas mudavam, as perguntas não estavam mais sendo direcionadas aos fabricantes, mas sim para nós porque a gente sempre teve uma base de conhecimento técnico e entende profundamente a necessidade do cliente. Nessas horas entendemos melhor o quanto o Brasil é uma escola única onde uma estação de televisão é uma enorme produtora com uma antena e um transmissor. Se uma empresa não tem condição de atender uma emissora americana, muito menos vai conseguir atender uma Globo ou um SBT. Agora, se uma empresa tem condições de lidar com projetos de atender demandas de uma TV Globo, te garanto, que se quiser e tiver vontade, vai atender TVB em Hong Kong, NHK, NBC, etc. – emissoras de qualquer lugar do mundo, porque o nível técnico e de produção do Brasil é muito alto.
PAV: Hoje quanto esta expansão para os Estados Unidos representa em volume de negócios para a CIS Group?
Matt Silva: O foco da CIS Group nos EUA começou realmente há 15 meses. Antes disso a proporção de negócios era 90% América Latina, 10% EUA. Hoje, 15 meses depois, já está numa situação de 65% América latina e 35% EUA. Ou seja, um crescimento significativo e isto só na Costa Leste.
Guilherme Silva: Importante dizer é que não se trata de um crescimento relativo porque os negócios no Brasil possam ter caído. O volume de negócios na América Latina nestes exatos 15 meses cresceu muito. Posso te afirmar que 2018 será um dos grandes anos da CIS Group na América Latina. Então, na realidade, esses 35% representam um crescimento em cima do crescimento da região LATAM. Se tivéssemos ficado limitados ao mercado Brasileiro numa época de crise, o percentual seria provavelmente de 65% nos EUA e 35% no Brasil.
PAV: Temos visto dois movimentos bastante intensos no mercado broadcast mundial que é a transformação dos workflows para sistemas baseados em software e ao mesmo tempo uma consolidação de mercado, com fabricantes tradicionais comprando uns aos outros. Como fica o integrador neste ambiente com menos hardware para vender e menos opções de oferta de sistemas?
Guilherme Silva: Do ponto de vista de mercado é importante que vejamos a consolidação como um resultado da verdadeira causa, a transformação digital implicando numa total mudança nos modelos de negócios e do processo de monetização das estações de televisão. Isso fez com que fabricantes convencionais e grandes marcas fossem sumindo ao longo dos últimos anos. Se você retroagir 10 anos, ficará assustado pela quantidade de grandes empresas que saíram do mercado. A crise começou a gerar esta consolidação que vivemos atualmente e a verdade é que muitas empresas estão em situação de risco, “vendendo o almoço para comprar o jantar”.
Os orçamentos passaram a ser decididos de cima pra baixo. Mas uma coisa que é preciso ter em mente é que dinheiro não desaparece, dinheiro muda de mãos. A questão do software traz uma grande flexibilidade, mas trouxe um sério problema para os usuários e os fabricantes. Para o usuário, trouxe o problema da economia de escala porque no passado ele comprava um VT e o ciclo de vida dele era cinco anos ou mais, e agora você compra um computador e o ciclo de vida é de um ano. Se você não administrar custo de propriedade, suporte e upgrade, você vai no mesmo período de tempo gastar mais do que o custo de “sistemas fechados”.
Do lado do integrador complicou porque o fabricante desenvolve o software mas precisa certificar o hardware para rodar. Nenhum fabricante do mundo vai ter a responsabilidade de certificar 200 sistemas diferentes. Certificar uma plataforma são meses de trabalho – você está assumindo a responsabilidade dela, porque você não sabe como ela vai crescer, como vai mudar.
Eu não tenho nenhuma vergonha de dizer que já chorei várias vezes olhando uma tela de televisão por saber o que está acontecendo por trás e como a CIS Group participou daquilo. Eu não posso parar pois, se eu fizer isso eu morro no dia seguinte, não tenho a menor dúvida disso
Com o conhecimento da tecnologia, você tem como absorver parte da certificação e até criar suas próprias certificações, onde você coloca o software de vários fabricantes e pode garantir o processo com plataformas diferentes. Claro que a CIS Group não vai certificar plataformas genéricas. Ao contrário, vamos procurar fabricantes com presença no Brasil, como HP e Dell. Então é um modelo de negócios que, se for explorado de forma eficiente, continua gerando margens suficientes para assegurar a estabilidade mínima necessária ao integrador, possibilitando o mesmo nível e qualidade de pós-venda.
Por último, isso abriu uma necessidade para os integradores, principalmente no mercado brasileiro em termos de mão de obra. Veja, o mercado atual não comporta que a CIS Group tenha diversos especialistas de tecnologia trabalhando em tempo integral para atender projetos eventuais. Com esta consolidação, há grandes profissionais que tiveram que sair das empresas e tornaram-se consultores, possibilitando acesso a esses profissionais por períodos específicos para atender determinados projetos, o que traz um aspecto muito positivo.
Matt Silva: Com esta mudança de paradigma, o que mudou é a forma que o conteúdo é consumido, a transformação da indústria está na outra ponta. Avanços tecnológicos na forma de distribuição de conteúdo motivaram essa mudança através da disponibilização de flexibilidade ao consumidor desse conteúdo. Mais especificamente, distribuidores de conteúdo hoje oferecem a oportunidade para todos nós assistirmos o que quisermos, quando quisermos, e em qualquer tela que quisermos.
Com esses avanços, produtores de conteúdo precisam levar em conta ainda mais variáveis – fluxos de trabalho mais eficientes, formatos diferentes, etc. Daí surge a oportunidade para o integrador – tendo o conhecimento e a parceria do fabricante para entender seu roadmap, você consegue ampliar seu expertise e continuar aumentando o valor agregado para o cliente. No lado do fabricante, esta consolidação só está começando, porque todo fabricante quer atingir economia de escala.
PAV: Vocês acham que existe um problema de falta de mão de obra qualificada para broadcast no Brasil? E como é esta relação nos Estados Unidos?
Guilherme Silva: Eu entenderia sua afirmação não só para o mercado broadcast, mas para o mercado de mídia. O tempo de formação de mão de obra qualificada, na metodologia que existe hoje nas poucas faculdades de Rádio e Televisão, ou nas empresas que têm condições de formar gente lá dentro, infelizmente é muito maior do que a mudança da tecnologia. Então estamos sempre correndo atrás do prejuízo. As forças individuais, como algumas empresas e a SET, são absolutamente insuficientes para resolver o problema.
O país do mundo que mais produziu engenheiros de broadcast e que também está em declínio é o Reino Unido. A BBC criou um legado de tecnologia que se refletiu de forma positiva. A gente não tem isso no Brasil. Houve tentativas de criar a BBC brasileira e o resultado não foi dos melhores, então, sou obrigado a concordar com a afirmação; há um problema de mão de obra qualificada que nada tem a ver com a competência dos profissionais.
Quando você transporta isso para os Estados Unidos, eu costumo dizer que os EUA não é um país muito inteligente, mas sim um país muito produtivo. Mas há esta infraestrutura, existem grandes escolas, incentivos para as empresas investirem na educação de seus funcionários. Como integradores aqui no Brasil, não temos incentivo nenhum para abrir estágios para formação, por exemplo. Qual o incentivo para contratar alguém numa faculdade e levá-lo para os EUA para treinamento?
Matt Silva: É um problema muito estrutural do Brasil. Não é com respeito à competência, é da mentalidade. Nos EUA, além dos incentivos para as empresas implementarem um programa de educação continuada, existe também o conceito de produtividade e eficiência; que é preciso fazer mais com menos. Lá você vê uma equipe de engenharia de 25 pessoas responsável por uma estação de TV imensa e usando processos definidos e de forma significativamente mais ágil. O fato é que no mercado americano você tem qualificações mais especializadas.
PAV: Agora uma pergunta pessoal Guilherme. Me parece que você vem preparando sua sucessão na liderança da CIS Group. Existe um plano de pendurar as chuteiras?
Guilherme Silva: Não é segredo nenhum que a passagem de bastão da CIS Group já começou. O Matt toca a empresa nos EUA sozinho, eu sei talvez o nome de dois ou três clientes que fazem parte do portfolio da CIS nos EUA. No Brasil, eu ainda continuo bastante envolvido e pretendo continuar por muito tempo, mas apenas sob o ponto de vista estratégico. Então no que se refere à CIS Group, até o final de 2019, eu passo oficialmente o bastão também no Brasil. Isso não quer dizer que eu vá sair da empresa. Para os que pensam em comemorar isso, eu posso afirmar que não há a menor chance. É uma nova fase da CIS Group apenas. Para fechar o ciclo e enfrentar problemas internos e externos, atuais e futuros, há que fazer um “update” no modelo de negócio e preparar a empresa para novos desafios. Muitas mudanças de mercado, tecnologia, consumo, legislação e monetização ocorreram ao longo dos 30 anos da CIS. Apesar de sermos uma empresa empreendedora, em alguns casos a gente não teve estas atualizações e ainda continuamos no modelo anterior. Então antes do final de 2019 eu entrego meu cargo de CEO, mas eu continuo na CIS Group com um cargo mais estratégico e talvez com tempo para fazer minhas degustações de whisky japonês.
Todos sabem que eu viajo excessivamente; é um absurdo a quantidade de horas de vôo que eu faço a cada mês. Acredito que é uma oportunidade única que eu tenho de conversar com clientes não só no Brasil e nos EUA, mas ao redor do mundo e entender as mudanças no modelo de negócios deles e trazer estas mudanças para a CIS.
E com toda a sinceridade, eu me considero um cara privilegiado pois, há 42 anos eu faço o que eu amo. Meu primeiro emprego de verdade foi em televisão. Sempre fiquei ligado a isso. Quando me perguntam quando vou parar, eu respondo que será quando esta indústria não me emocionar mais. É uma paixão, provavelmente do mesmo calibre daqueles malucos que ficam acampados três dias em frente a uma Apple store porque querem ser os primeiros a comprar o novo modelo de iPhone.
Eu não tenho nenhuma vergonha de dizer que já chorei várias vezes olhando uma tela de televisão por saber o que está acontecendo por trás e como a CIS Group participou daquilo. Eu não posso parar pois, se eu fizer isso eu morro no dia seguinte, não tenho a menor dúvida disso.
Então estou sim pendurando as chuteiras de CEO, mas não pendurando as chuteiras da CIS. Não foi uma coisa planejada. A ideia começou há 3 anos, na primeira conversa que partiu do Matt ao vir falar comigo, o que me surpreendeu, quando se interessou em sair de uma mega empresa como é o Credit Suisse para vir se colocar em um mercado ultra-complexo.
PAV: Agora para você Matt, o que esperar do futuro da CIS Group no Brasil, nos EUA e talvez em demais territórios?
Matt Silva: Você tem visto a expansão no mercado brasileiro com esta equipe nova de vendas e pré-vendas que trouxemos para o nosso time há poucos meses. Ainda vemos espaço para continuar expandindo no mercado Brasileiro, em particular na área de pós-vendas. Fora isso, no Brasil, a gente vê o país como um mercado maduro. Nos EUA é uma expansão nascente, que ainda vai demorar um pouco pois lá não temos a mesma imagem que temos no Brasil e a mesma penetração. Lá devemos ter uma expansão técnica, porque todas as integrações para ambos os territórios têm saído de lá.
Mas claro, sempre teremos foco no Brasil porque aqui é nossa casa, é onde o coração está. E nos EUA é outra perna de crescimento que estamos realmente focados nisso também, mas de novo, a prioridade continua sendo Brasil, como o crescimento da nossa infraestrutura mostra. Para outros territórios além dos EUA não temos planos agora, talvez seja algo para se considerar em alguns anos.
Guilherme Silva: Eu estou com 61 anos de idade, e posso dizer que pelo menos enquanto eu estiver vivo, não há como a CIS abandonar o mercado brasileiro. Uma coisa que falta no mundo dos negócios hoje é as empresas terem a gratidão aos mercados que as fizeram. Eu sou um cara grato. Sei que sou uma pessoa polêmica, que tem gente que prefere me evitar, mas eu posso dizer que não me falta gratidão ao mercado Brasileiro. Eu não nasci no Brasil, e mesmo assim este país me recebeu de braços abertos, me deu oportunidade, e no mínimo eu tenho a obrigação de dar alguma coisa de volta.